Meu maior desejo, esse sonho que me visita como uma melancolia doce, é ver nascer
de uma mulher um herdeiro meu, não por vaidade de sangue, mas por essa necessidade estranha de continuar no que não sou eu. Imagino-o pequeno, febril, e eu a cuidar dele como quem cuida de um poema imperfeito, tentando aquecer o que a vida insiste em esfriar.Vejo-me dando-lhe comida quando sentir fome, afeto quando sentir falta, silêncio quando a solidão o tocar, porque até o silêncio, às vezes, é carinho. Conduzi-lo até a escola seria como entregar ao mundo uma parte de mim que nunca soube realmente viver nele. Comprar-lhe brinquedos, roupas, observar seus primeiros passos de independência.. tudo isso me parece uma forma de existir fora de mim, de escapar do cárcere interior que sempre carreguei.
E quando imagino suas conquistas, suas notas, seus projetos, até suas primeiras paixões, percebo que esse filho, ainda inexistente, já é mais real do que eu. Talvez porque, no fundo, o que desejo não é apenas vê-lo crescer, mas acreditar que alguma parte de mim, aquela que nunca se encontrou, enfim terá um destino mais certo do que o meu.